terça-feira, 30 de setembro de 2008

Em Fogo 27 - Amizade

O melhor da Vida é poder conviver com pessoas que consideramos Amigos, contudo há uma grande diferença entre Amigos, amigos e conhecidos, na exacta proporção da sua importância. E qual a vantagem de ter casa própria, senão para poder receber os Amigos e fazê-los sentirem-se bem?
Poder juntar Amigos à volta de uma mesa, trocar impressões, recordar momentos passados ou criar ali um momento, partilhar um sorriso ou oferecer o ombro para desabafo, sentir que os outros estão felizes por estarem ali, partilhar um copo do vinho mais caro e sentir que o verdadeiro tesouro é quem o bebe connosco.
Quando nos sentimos bem com esses Amigos, somos como pequenas gotas de vinho, reminescências de sangue, que se unem num copo e formam um liquido espesso e compacto que dá prazer beber. Nunca se pode dizer que temos muitos Amigos, contudo, eles podem ser poucos e ao mesmo tempo representarem o Mundo para nós.
São eles que nos aguentam as birras, que se riem connosco, que nos dizem "tem calma" ou "vais ultrapassar isso", que se exasperam connosco e nós com eles, que nos olham e sabem como nos sentimos, que partilham momentos ou ficam simplesmente em silêncio.
Somos gotas... gotas perdidas... os Amigos completam-nos, dão-nos força, carinho, atenção e transformam momentos banais em especiais. Quem diz que prefere estar só não se leva a sério porque sem Amigos não se consegue suportar uma Vida baseada em batalhas sucessiva de busca do Graal da Felicidade, esse eterno mito.
Para mim ser feliz é estar rodeado de Amigos e sentir que estou, realmente, acompanhado porque podemos estar sozinhos no meio de uma multidão ou sentirmos-nos sós no meio de amigos ou conhecidos.
O que faz um bom Amigo? Tem capacidade de partilha... tem um grau de loucura... tem a intensidade de viver... tem a sensibilidade para ajudar... tem a fé para acreditar no outro... tem o desejo de ser feliz e fazer alguém feliz.
Os Amigos podem ser intensos como um "Esporão", leves como um "Casal Garcia", encorpados como um "Quinta do Cardo", sensuais como um "Ramos Pinto Collection", exóticos como um "Syrah" ou simplesmente diferentes como um "Rosé Periquita". Aos Amigos não cobramos a diferença, aceitamos... aos Amigos não criticamos, apoiamos ou sugerimos... aos Amigos não dizemos que não, estamos lá mesmo quando eles não esperam... aos Amigos não respondemos mal, podemos é estar indispostos que eles entendem... aos Amigos não explicamos o que se passa, eles partilham os momentos connosco... aos Amigos estendemos a mão mesmo sabendo que eles podem não a querer de imediato mas, um dia irão precisar... aos Amigos olhamos a alma e sentimos com eles.
Aos meus Amigos dedico este texto... uma refeição de Sushi é, igualmente, a partilha de sensações e nada melhor que o fazer rodeado de Amigos.
Carpe Diem.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

BURACO NEGRO XVIII

Este é o mais pequeno, dizem. Já visitei o maior conhecido, já andei à deriva neste bem pequenino. Cansei-me.
De olhar dentro deles e não conseguir ver a luz que avidamente sugam à sua volta. Cansei-me.
De olhar-lhes o fundo e ver um mundo ao contrário, era giro, mas como todas as brincadeiras perdeu a graça. Cansei-me.
Vou mudar de Galáxia. Contaram-me de um planeta que, de tão diferente destes que conheço, parece estar à minha medida, agora.
A tecnologia que conhecemos, há muito que lá foi dispensada. Não percebi bem, mas tudo se faz com a energia dos seres que o habitam. É pelo menos refrescante e muito caloroso, suponho!
E as palavras...parece que deixaram de as usar! Passaram aos conceitos-imagem?? Não contam que viram um pôr-do-sol e como ficaram felizes...apenas transmitem a imagem do que viram e a sensação que os fez experimentar. Perfeito!
Acho que vou...descansar das palavras. Espera-me uma quarentena, preciso de me livrar de uma adição dispensável. Preciso aprender a ver, sentir e transmitir.
Acho que vou... já me cansei das palavras que querendo dizer tudo, não dizem nada e das que nada querendo dizer acabam por dizer tudo.
Acho que vou...não sei se voltarei. Dizem que lá, uns quantos são escolhidos para guardar a memória das palavras, preciosidades de um passado atormentado.
Talvez seja essa a escolha que me aguarda e então, quando passar o tempo adequado para que não seja mais uma necessidade usa-las, vos mandarei uma palavra.
Se esse não for o meu caminho...assim que souber como, chegarão, à velocidade da luz, as mais belas imagens que sentir, para lhes contar que estou bem.

sábado, 27 de setembro de 2008

Imaginário XXXII

Era uma vez, numa época qualquer e sem ter que ter obrigatoriamente príncipes, princesas, cavaleiros, bruxas, poções mágicas, nevoeiros, fadas e tantas outras coisas que embelezam as histórias de infância, um menino.

Este menino era daqueles meninos muito tímidos, muito virados para si, muito metido no seu mundinho, muito entretido com as suas coisas e raramente reparava no que estava à volta dele.

Bem, não seria bem assim.

O menino era muito curioso, muito muito curioso. Ele seguia os carreiros das formigas para ver o que elas faziam, ele contava o tempo que demoravam e chegou até a comer uma para ver a que é que sabia.

Ele olhava o sol pela janela e antes de aprender os movimentos de translação e rotação já sabia de intuição que em cada momento o sol ocupava um lugar diferente. Mas não sabia os nomes. Sabia as coisas.

Então ele sabia muitas coisas que os outros meninos nunca tinham pensado porque estavam sempre a brincar àquelas coisas parvas que todos os meninos brincavam e não serviam para nada. Mas não sabia os nomes das coisas e essas sim, os outros meninos sabiam bem - não as compreendiam nem sabiam como funcionavam mas sabiam todos os nomes de todas as coisas.

Este menino foi crescendo sem nunca ter sentido a falta das brincadeiras. Sentia falta do tempo. Quanto mais olhava para tudo e tentava compreender tudo mais intuitivamente sabia que nunca teria tempo para saber o que estava a seguir.

Um dia uma menina foi ter com ele.

- Olá menino.
- Olá menina.
- Como te chamas?
- Chamo-me o que me quiseres chamar.
- Não tens nome?
- Que importa o meu nome? Eu sou eu independentemente do que me chamares.

O menino pareceu muito complicado à menina, mas também ela sentia algo semelhante, apesar de não ser contra os nomes, ela achava que as coisas deviam ter nomes, só para todos sabermos do que se falava.

- Se virmos desse modo sim, menina, mas até agora nunca ninguém falou comigo das mesmas coisas.
- Queres brincar comigo?
- Brincar? Eu não gosto de brincar.
- Não gostas? Gostas de fazer o quê?
- Gosto de contar estrelas à noite e ver que a cada dia parecem no mesmo sítio mas ao fim de dias as posições são diferentes, por exemplo.
- Essa é uma das minhas brincadeiras favoritas!
- E gostas de apanhar gafanhotos e ver como são as suas patas?
- E carochinhas da areia!!

E o menino e a menina foram brincar.

Ela ensinou-lhe os nomes e ele ensinou-lhe a ter calma e a esperar porque as coisas maiores da vida não se viam ao primeiro olhar ou demoravam tempo a acontecer.

E cresceram juntos. E aprenderam tantas coisas juntos que se esqueceram do resto do mundo.

Quando repararam viviam no mundo deles onde mais ninguém tinha lugar e que mais ninguém compreendia. Mas era o mundo deles. Onde mais ninguém cabia.



Sim, viveram felizes para sempre.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Vivências 50


A vida tem alturas em que nos põe à prova numa daquelas para as quais nunca pensámos estar à altura...

Não é maldade dos outros, não é infelicidade da vida é apenas uma triatlo que nunca fizemos e que nos coloca as dúvidas mais tolas... ou não!

Vejamos nadar: tenho tendência para dar umas belas braçadas mas, mais cedo ou mais tarde acabo sempre por me afogar num cansaço tolo em que julgo sempre, vais conseguir, não precisas de boiar porque parece mal e pior parecerás fraca!

Bicicleta: sim, claro, nunca se esquece e aqui há coisa de uns anos, até aprendi a levantar o rabo para ter mais "gana" na velocidade e não uma de "tótó" mas depois, acabo sempre com as pernas feitas "num 8, literalmente, e com o rabo a dizer-me - baixinho, é verdade - but, never the less: Ai porra ca estúpida de me tratares assim...

Por fim, a corrida: também é verdade que se fosse em velocidade eu e o Obi tínhamos um belo "hobby", ele a correr e eu a vê-lo passar mas, ainda tou "prás curvas"...

O problema é que o meu nome de facto não é Vanessa e não sei nada do que queiram de mim a 3 (PROVAS entenda-se)... sou boa no volei e já dei algumas "cartas" quando era profissional... hoje em baixo de forma, até mental... só peço para que não me peçam mais uma prova...
Não consigo!

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Experiência 19


Começou há uns dias o Queer Festival... ainda sou do tempo do Festival Gay e Lésbico mas depois, sem saber muito bem porquê deram-lhe este novo nome que me faz lembrar de gente FREAK... que é isso mesmo que me crê que a comunidade gay (both ways) não deve querer de todo... pelo menos os meus amigos(as) não são e nem querem ser vistos como tal...

Enfim, passando à frente, começou e pronto. É natural eu ir todos os anos esporadicamente ver um ou outro filme, normalmente, relacionados com a parte mais sociológica/politica do tema mas só no outro dia acompanhando um amigo (mesmo só isso... alto!) dizia e era MESMO verdade: "Já viste como os rapazes estão giros? Bem e as miúdas... ... ...".
Não comentei... assenti e segui para o bar!

Gostei do filme... de ter bebido uma cerveja ocasional e ter escutado uma ou outra conversa engraçada acerca do amor... sem ter na cabeça a ideia tola e pré-definida de que aquele festival só vão os gays e lésbicas (e os bissexuais) mas também vamos nós: os FREAKS que não têm complexos e que se borrifam para as convenções!

No meio da coisa o Manel (amigo e colega) ainda veio ter connosco e ele sim, comentou: "Que miúdas podres da boas!!!" mas o Manel sim, tem idade para ter juízo, não só porque todas já tinham namoradas mas, acima de tudo porque não olharam sequer para ele... não porque tem idade para ser pai delas (porque isso é mais uma estupidez do nosso espírito) mas porque não estão... parafraseando-o "pra`li viradas!"

Claro que no fim do cinema ainda tive de ouvir a magnifica "boca" de: "Elas olham pra ti porque tens aquele ar metro-não-sei-quê pouco definido e eles olham também porque... sei lá tens ar gay... ou coiso assim...! E esse teu amigo deixa-me que te diga é gay de certeza..." Lixei-o: "Oh Afonso, chega aqui que o Manel tem uma ou outra pergunta para te fazer enquanto vou ali ao bar!"... O Manel ficou roxo como estas letras! Toma, pensei, que é para deixares de ser parvo...


Olhei-o de esguelha quando depois se aproximou de mim e entretanto isso foi o suficiente para um pedido de desculpas mas... nessa noite, depois de estar de novo só em casa, enquanto bebia o meu martini e fumava o meu charuto (coisa que já não fazia há muito tempo), olhando as estrelas pensei: "Ele realmente há gente que tem uma mente bem pequena!"


No dia seguinte acordei... vi o programa do Festival e pensei: "Porreiro sexta vou ver este filme! Parece-me bom!"

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Em Fogo 26 - Fuga Surreal

Subia as escadas em formato de caracol com um sentimento opressivo no peito,
subia sem saber porquê nem o que encontraria no cimo,
subia sem parar para respirar porque queria saber o que as curvas escondiam,
subia porque fugia do solo...
Subia porque estou farto da vida comum,
cansado da monotonia de uma vida feita de rotinas e horas certas,
cansado de lutar por um amor que não resulta,
cansado de pensar que um dia poderei ser feliz ou fazer alguém feliz...
Sempre me disseram que as coisas acontecem quando menos se esperam,
então se deixar de esperar elas acontecem?
Deixei de esperar e nada se passou, por isso, subo as escadas e
talvez encontre o sentido para a minha vida,
talvez descubra se posso continuar a sonhar,
talvez entenda o porquê de tanto azar...
Continuei a subir as escadas em forma de caracol sem pensar,
sem ter esperança que no cimo estivesse algo que me desse alegria,
sem acreditar que ao terminar a subida tivesse sorte,
sem acreditar...
Quando ia a meio da subida olho para baixo e surpreendo-me,
a escada parecia uma onda e eu seria um peixe perdido do cardume no mar?
Olhei com ainda mais atenção e reparei que a escada era azul,
sempre me disseram que era a cor da esperança e
o que será que isso quer dizer?
Subi o ultimo lanço da escada e parei no cimo em frente a três portas...
A primeira era de ouro, magnificamente executada e muito pesada e dizia:
"Se me abrires descobres tudo o que sempre sonhaste"
A segunda era de prata, fulgurante e tão limpida como um espelho e dizia:
"Se me abrires podes concretizar o que os teus olhos conseguem vêr"
A terceira era de latão, velha, estragada e ligeiramente amolgada e dizia:
"Se me abrires arriscas tudo o que tens mas serás recompensado"
Olhei as três portas e fiquei na dúvida...
Qual delas deveria abrir, ponderei, senti o toque de cada porta,
tentei ouvir qualquer barulho vindo do outro lado,
li várias vezes o que cada porta tinha escrito e...
Sou uma pessoa que gosta de arriscar disse eu para mim mesmo,
não procuro recompensas materiais mas sim a Felicidade
que não se alcança sem sacrificios e por isso,
rodei a maçaneta de latão...
A porta abriu-se lentamente e tudo estava escuro do outro lado
hesitei por segundos mas a decisão estava tomada, avancei um passo
conforme ia avançado a luz acendia-se acima de mim para iluminar os meus passos.
Fui ter a uma pequena sala onde dois focos de luz incidiam sobre um vulto numa cadeira...
Quando me aproximei da cadeira reparei em ti,
estavas linda num vestido castanho colado ao corpo revelando as formas do teu corpo,
estavas linda com um sorriso na boca e nos olhos,
estavas linda com o cabelo a tocar os ombros, solto e leve
estavas linda com os pés descalços mas com uma pulseira em redor do calcanhar.
Aproximei-me de ti e disseste:
"Aqui estou, sou assim, toma-me e eu tomar-te-ei...
Seremos um só e por isso perderás tudo o que te identifica...
Com um beijo calarás a minha boca, vem, aproxima-te"
Eu fui ter contigo, segurei-te no rosto e beijei os teus lábios doces e carnudos,
foi nesse instante que...
Carpe Diem.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

BURACO NEGRO XVII



Estava eu repousando, num asteróide, na orla gravitacional de um pequenino buraco negro, quando recebi um sinal de nave em aproximação. Como esta coisa de andar de buraco em buraco é uma fantasia muito solitária, dei a conhecer a minha presença esperando quebrar a monotonia com alguma novidade...
A nave, abrandou a velocidade, o que me permitiu sondá-la. Descobri a bordo três presenças.
Ao meu contacto, senti na mente o arranhar metálico de uma resposta de computador. Sim, a bordo viajavam três espécimes orgânicos, do planeta Terra, a saber: duas ex e um perito.
Hurra! gritei pra dentro.
Hurra?? que é isso de ex e perito?? cargos? agentes de experiência cientifica?
Lenta e suavemente projectei-me para a nave tentando entrar em sintonia com algum dos tripulantes.
A primeira mente onde entrei, mostrou-me um borrão estranho e à minha saudação esborratou-se um pouco mais. Quando tentei penetrar mais fundo para saber quem era só encontrei uma resposta: ex do perito...ex do perito...ex do perito...que raio, pensei.
A segunda mente que aflorei, agora mais a medo, apresentou-se como uma parede de tijolos grafitados: ex do perito... ex do perito...ex do perito... mau, pensei
A terceira mente, invadi, provoquei um gemido de dor, entrei mais fundo, e deparei-me com um caleidoscópio que girava, girava, girava e gritava: perito... perito... perito...
Acordei! sempre soube que adormecer na orla de um buraco é muito perigoso...têm-se os piores sonhos...os premonitórios.
Percebi que era hora de partir...antes que aquela nave passasse por ali e eu quisesse mesmo saber a verdade.


sábado, 20 de setembro de 2008

Memórias I

Hoje, e pelo menos por aqui na minha zona, o dia acordou cinzento. Calmo, abafado e cinzento.

Dias como este transportam-me até à minha infância. Da minha infância os dias que melhor me lembro são os dias cinzentos. E como eu gostava de dias cinzentos...

Não pensem vocês que eu sou uma pessoa cinzenta.
Gosto de todos os dias, não fico triste se estiver sol nem radiante se chover a cântaros. Apenas gosto de todos os dias. Gosto quando faz sol, gosto quando faz chuva. Não gosto muito de vento especialmente o dos dias de inverno que parece lâmina afiada na pele. Não, não gosto de vento. Não gosto dos cabelos na boca, da areia nos olhos nem de, caso esteja a chover, do chapéu-de-chuva a virar-se.
Mas do mesmo modo que gosto de um dia de sol seja ele no inverno ou no verão gosto de um dia de chuva seja quando for. E os dias de chuva para mim são mais especiais, quase os acarinho e muitas vezes anseio por eles.

Dias como o de hoje, dizia eu, levam-me a tempos que parece que já terem sido há muito tempo, não fosse pela nossa referência cronológica terem passado pouco mais de 20 anos e eu diria que tinha sido há décadas atrás - séculos, milénios...

Nestes dias de Setembro que adivinhavam já o fim dos 3 meses de férias de verão eu já não tinha fichas da escola para fazer. Não tendo as minhas fichas não tinha nada para fazer - achavam os crescidos. Mas tinha, eu tinha sempre muito que fazer.

Saía de casa para o quintal e dava uma corrida tentando esquivar-me aos pingos grossos enquanto ouvia, cada vez mais sumida, a voz da minha avó que gritava que eu me ia encharcar e ficar doente e que voltasse para casa. E enquanto ela não vinha abrir a porta para ver o que eu fazia eu rodopiava à chuva correndo para o fundo abrigado do quintal. E quando ela abria a porta já eu estava debaixo de telhas com a minha bata da mercearia vestida.
Abria a mesa de brincar, abria a arca e tirava a minha caixa registadora azul com botões amarelos. Cortava papel que enrolava em rolos apertados e dispunha em caixas improvisadas e devidamente colocadas pela ordem que nesse dia me interessava os produtos imaginários que só eu e os meus clientes imaginários víamos.

Quando a chuva apertava mais a minha loja ficava mais vazia e os clientes tardavam. Nessa altura eu aproveitava para fazer uns desenhos que iam ser quadros um dia ou para fazer as contas do dia e ir buscar mais stocks.

Se chovesse o dia todo eu trabalhava muito.

Quando o sol espreitava os clientes desapareciam. Eu saía do barracão. Fazia uma festinha ao Jota e despia a bata. Com a chegada do sol as brincadeiras acabavam. O meu irmão saía de dentro de casa e vinha buscar a bicicleta dele ao espaço que era a minha mercearia - ou a minha escola ou o meu consultório ou o meu atelier. Eu nunca via a oficina dele e ele nunca via as minhas actividades.
Então quando chegava o sol o meu barracão era outra vez um barracão com dois baús cheios de brinquedos que só ganhavam vida quando chovia.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Vivências 49


Estranha a sensação de estarmos em constante mutação sem estarmos de facto...

Estranha a sensação de querermos estar noutra dimensão sem estarmos de facto...

Estranha sensação de querer algo que sabemos que jamais haveremos de alcançar...

Estranha sensação esta de não estarmos com quem queremos, no sítio em que desejamos com as horas que ambicionamos... estranho e infeliz!

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Experiência 18


Um amigo de pouco tempo... Relatou-me hoje que o mundo estava perdido...
Perante semelhante sensação tão bela, e de quase redenção, não ousei perguntar mais nada...
Contudo, como é apanágio dos meus amigos (sabe dEuS porque carga de água) ele prontificou-se a resolver-me desde logo o... tal, o dito, do teorema, ou seja lá o que isso for:

- Repara - dizia convicto - aqui há coisa de umas semanas foi a Lohan...
- Agora é a Minogue...
E dada a minha estupidez... e cara disso mesmo, acabou por me explicar a coisa de forma MUITO sucinta e quase aparvalhada (para mim!):

- Não vês??????? Estão todas a dar em lésbicas!!!!!!!
Sem comentários porque de facto, depois de ter "acabado" uma relação há relativamente pouco tempo e disso me provocar uma quantidade inexplicável de sentimentos contraditórios... não estava "prá`í" virado... e de novo, sem lhe perguntar nada, ele continuou:

- Qualquer dia estamos arrumados!!!!!!! Em prateleiras ou pior...
Ao que eu, na minha maior inocência respondi:

- Os homens diz-se que não voltam porque quando vão não querem outra coisa... As mulheres... bom, as mulheres é apenas porque é o 4º segredo de Fátima. Ninguém o disse mas todos sabemos... uma mulher com outra deve ser... o coiso, o tal e mais não sei o quê...

Estava deprimido, fui até Alfama e bebi mais um copo... esperançado que as únicas pessoas que se cruzassem comigo fossem apenas fadistas, porreiros, sem mágoas (porque já as haviam cantada) e com uma "pint" para pagar!!!!!!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Em Fogo 25 - Divagações em Flor

Quando se descobre que um Amor acabou?
Quando se pensa que a pessoa que amamos, afinal, não é assim tão importante?
Quando acreditamos que não vale a pena?
Qual é o momento de parar e mudar de vida?
Perguntas... umas terão respostas e outras manter-se-ão incógnitas...
Somos, por natureza, curiosos mas... porque será esta Vida um complexo enigma?
Terá a ver com o facto de, sendo dificil, tudo valer mais a pena?
Darmos mais valor aquilo que temos quando é dificil ser feliz?
Se assim fosse andavamos todos radiantes... e o que acontece?
Pessoas incomunicáveis, gestos inconcebiveis, sonhos desfeitos
Medo, repressão, preconceito, ressentimento... sensações incofessáveis...
Pessoas que sofreram e, por medo de voltar a sofrer, não se entregam...
Somos nós que tornamos a Vida mais dificil do que ela é
ou
a Vida gosta de se fazer dificil para ser apreciada?
Se olharmos para a Vida com os nossos olhos vimos que,
Por vezes estamos mais acompanhados sozinhos que numa multidão
O Sol cria um espectaculo todos os dias só para nós
A Lua espalha magia sob as aguas nas noites em que se enche
Uma flor oferecida mantém sempre o cheiro quando dada com Amor
O Amor é um sentimento intenso que deve ser usado com razão
A razão deve ser usada com loucura
A loucura é um ingrediente do Amor
O Amor é loucura e razão
E depois... um relacionamento desmorona-se...
quando a flor oferecida se decompõe
quando olhamos para o outro e vemos um estranho
quando a sensação de novidade passa e julgamos-nos sós acompanhados
quando o nosso olhar já não se perde nesse outro olhar
quando parece mais interessante a ideia de estar acompanhado do que ficar só
Que fazer depois disso?
Recordar os momentos passados
Olhar o horizonte
Respirar fundo
e viver...
A resposta para a Vida só pode ser não desistir,
mesmo que a sorte nunca esteja do nosso lado
mesmo que o nosso sonho demore a se concretizar
mesmo que encontrar alguém pareça impossivel
mesmo que a vontade de chorar seja superior a um sorriso
mesmo que se tenha de contar o dinheiro mês a mês
A solução?
Sorrir, sorrir muito
Amar, amar muito
Quando a oportunidade surge não pensar, agir
Sejam felizes com aquilo que têm
pelo que são
como são
e sonhem, sonhem muito.
Carpe Diem.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

BURACO NEGRO XVI


Entrei na pastelaria para fazer tempo. Uma imperial...e um cigarro se pudesse, mas não podia.
Assim entretive-me a olhar à volta, as mesas ocupadas. Naquele bairro, àquela hora, a maioria mulheres, pareciam ser as clientes habituais do fim da tarde.
Numa mesa, quase a meu lado, uma mulher chamou a minha atenção. Ainda na casa dos quarenta, parecendo menos, bem arranjada, dividia o olhar entre um livro e o espaço que a circundava com ar distraído. Bebericava um chá, aparentemente já frio, desfazia restos de scones com os dedos um pouco grossos, sorria por vezes como quem lembra uma boa piada...
Pude ver a capa do livro de relance, reconheci um autor da moda, cujas histórias tanto agradam aos que buscam o pensamento abstracto sobre as coisas do dia a dia e neles encontram explicados os seus sentimentos simples, em definições rebuscadas, e muito reconfortantes...
E eu sei, também o li, e se não fiquei com a ideia mais clara sobre o assunto que trata, pelo menos percebi que há mais gente como eu...
Mas não disto que quero falar hoje...
A tarde foi caindo, bebi mais uma cerveja, continuei a observar a mulher, tão tranquila no seu olhar deambulante, nos seus gestos mansos e tive inveja daquela serenidade.
Entrou mais gente no café, dois sujeitos dirigiram-se àquela mesa e em silêncio, esperaram.
A mulher, chamou o empregado, pagou a conta, levantou-se lentamente...derramou o resto do chá sobre a mesa, desfez o último scone entre os restos de manteiga e doce e seguiu os homens.
Só então lhe vi o brilho alucinado do olhar, o esgar de loucura nos lábios.
Saí, acendi um cigarro à tanto apetecido e soube pelas conversas da rua que era assim... a mulher chegava, pedia um chá com scones, perdia-se no tempo da tarde, até chegarem para a levar de volta à clínica caríssima, para doente mentais, onde vivia à anos e de onde saía todas as semanas para um chá vigiado...
Outro cigarro acompanhou-me as lembranças e fugi para o carro.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Vivências 48


Faz tempo que li um livro que sempre me questionou: inicialmente na sua formula mais simples (se é que isso se pode dizer acerca de um a livro e depois, na sua fórmula mais complexa)...

Não desvendo o livro, não desvendo o enredo para nada se perder até porque... Tudo Arde até até ao fim...

Contudo deixo aqui algo que me deixou, na altura bastante... algo... um pouco, enfim: "perdida"...

"(...) O encontro final entre os dois amigos, em que Henrik toma a iniciativa de tentar encontrar uma explicação para o sucedido há 41 anos atrás, na posse de um diário de Krisztina que tinha falecido 8 anos após o desaparecimento súbito de Konrad, decorre em crescendo de mistério e suspense quanto ao seu desenlace, mormente por o diário nunca ter sido aberto e por várias dissertações e divagações de Henrik quanto ao sentido da vida, ao que está por detrás das relações entre as pessoas e as suas motivações, e a explicação natural, maturada ao longo dos anos, para tudo o que aconteceu. Num silêncio cúmplice, o pensamento de Henrik parece ir de encontro a uma sabedoria de vida revelada por Konrad, em que, os dois por percursos bem diferentes, parecem ter chegado (...)"

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Experiência 17


A minha vida... mesmo de férias tem sido uma confronto entre presente e passado...
Entre certo e errado...
Entre ética e falta da mesma...
Entre amor e dor...
Entre querer descanso e paz e guerra ao estilo de Sun Tzu...

A minha vida mesmo de férias... é a minha vida mesmo, sem férias: o constante procurar que dá muitas das vezes comigo em louco...

Passo de novo férias sozinho... e isso é de novo, triste!

Passo no entanto, as minhas férias repleto de livros, recordações e com perspectiva de querer olhar em frente mesmo que, por cima do ombro, olhe (como era de esperar, para trás)... um pouco "amaricadamente", eu sei, hoje acordei quase sem fôlego, quase sem batimentos, com uma estúpida ansiedade e uma enorme lágrima que escorria ofensiva rosto abaixo sem que lhe desse permissão...

Na verdade hoje acordei, como usual há já alguns dias de madrugada: sentia todo o prédio a dormir e apenas eu com insónia despropositada... lembrei-me de repente de um livro que tinha lido faz pouco tempo:

«A Possibilidade de uma Ilha» que se trata de um romance que diz respeito à humanidade, à sua história e ao seu tempo presente, que é posto em causa, e onde num devir possível através da tecnologia e da religião se chega a um mundo expurgado de todas as deficiências humanas, soberbamente comandado pela razão, suficientemente estável ao longo de séculos para se acreditar numa verdadeira evolução, mas lentamente corroído pelo fatal ciclo de necessidade de mudança inerente a todo o ser humano, ao encontro da sua realização como tal.

Numa escrita por vezes um pouco densa mas cativante, muitas vezes crítica e filosoficamente (bem) sustentada face às questões que se colocam à personagem principal (Daniel), demonstrando uma mestria absoluta e um grande à vontade no tratamento dos temas fortes ligados à existência humana e à vida em sociedade, com foco nos tempos actuais, sem esquecer os ensinamentos de muitos filósofos traduzidos e citados em pensamentos práticos, Houellebecq oferece um contributo, tão macabro quanto útil, de uma lucidez que tanto pode agradar quanto deprimir o seu leitor, mas deixando a réstia de esperança de que uma ilha sempre existe, não importa quantas crueldades aconteçam e continuem a acontecer ao longo de todos os tempos, nas mais variadas formas, inevitáveis como parte integrante e indissociável da existência humana e da própria Natureza.

Com este pensamento em mente: tomei um daqueles "supositórios orais" para se dormir rapidamente... e quase, quase que senti... paz! Quase...

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

BURACO NEGRO XV

Foto google


Hoje lembrei-me como era fácil o tempo que passava contigo!
Corria entre risos, conversas, musica e lágrimas.
Os risos eram sempre felizes ou tristes mas nunca foram só sorrisos.
As conversas sérias ou tontas foram sempre de palavras verdadeiras.
A musica, estranhamente era dividida entre a descoberta e o reviver.
As lágrimas eram tuas, sempre rapidamente apagadas pelo meu estar ali.
Hoje imagino que o teu riso continua fresco e leve mas acredito ouvir nele um soluço.
Hoje as tuas palavras serão ainda fáceis e certas mas acredito saber delas o lado incerto.
Hoje a tua musica continuará a ser a mesma mas acredito ler nela o reavivar da dor.
Hoje as tuas lágrimas rolarão num rosto amassado pela certeza da perda!

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Vivências 47


Amar... significa muita coisa para muita gente, por vezes, demasiados significados para, de novo, muita gente...

Amar significa, simplesmente, a pessoa certa e a alegria plena para depois... morrer!

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Experiência 16


Estou de férias....
Supostamente descansado...
Mas afinal não...
Preocupações enchem o espírito,
o certo e o errado também...
Hoje felizmente: só quero estar contigo, nu na praia, ébrio e a dizer tudo certo ou, caso não seja a situação, ao menos que fique calado!

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Em Fogo 24 - A Pintura

Pensei pintar-te, capturar a tua essência numa tela vazia, sentir a tua força pela imagem
imaginada de ti, olhei a tela em branco e pensei...
Pensei como poderia representar-te e mostrar aos outros o que significas para mim,
queria que olhassem a tela e te vissem.
Não sei desenhar figuras e por isso quis ser abstracto,
qual seria a cor que se adaptaria mais a ti?
Azul?
a suavidade do céu misturado com a intensidade do mar, tal como tu
me deixas quando te vejo;
Vermelho?
calor, paixão, sedução... tudo aquilo que me fazes sentir, quando
beijo os teus lábios;
Verde?
a cor da natureza, onde passamos momentos de contemplação com o
silêncio falado na troca intensa do olhar;
Castanho?
a recordação do cheiro, como o da terra molhada quando chove... ou
o teu cheiro que deixas na minha pele e eu que quero sempre mais;
Laranja?
o calor do Sol... tal como tu me iluminas e me fazes renascer dia a dia,
com a força do teu sorriso e a intensidade do teu viver;
Cinzento?
a tonalidade da Vida que, tal como tu, não é em tons de branco ou preto...
tens muitas camadas que me faz desejar explorar-te mais e mais;
Preto?
cor única e forte... a forma como me completas e fazes sentir
único na tua presença;
Branco?
cor primordial, como a suavidade das nuvens... foi com suavidade que
apareceste e deste a volta ao meu Mundo.
Com tantas cores à minha escolha ainda não decidi como quero o quadro,
apenas tenho a certeza de não querer um arco-iris... quero
demonstrar desejo, sensualidade, intensidade, beleza, carinho,
e esse bicho estranho que é o Amor.
A bancada onde pinto estava pronta, a tina preparada para misturar as cores, os
tubos de côr alinhados e prontos para a tarefa, os pinceis limpos e a tela no cavalete,
mas... sentia que me faltava alguma coisa
Olhei a tela vazia no cavalete, fechei os olhos e vi-te...
Como posso pintar um sorriso?
Como posso pintar uma sensação?
Como posso dizer "amo-te" às cores?
Como posso transmitir o que sinto apenas com um pincel?
Algum tempo depois decidi que queria uma pintura sensorial... peguei no anzol que me
largaste quando me conquistaste, espetei ai o meu coração tal como tu me fizeste
quando te vi e te aceitei...
Assim ficou o meu quadro, sem cor, mas com a intensidade
de um momento onde um coração se perdeu nas teias da paixão.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

BURACO NEGRO XIV



Imagem Google



Não foi uma estrela candente que nos traçou a fogo os riscos na pele

Não foram as gotas da chuva que nos escorreram no rosto as linhas de uma tristeza doce

Não foi o vento que nos pingou lágrimas nos olhos

Foram as palavras que escondemos e nos queimam a garganta

Foram os abraços que não demos a marcar um sorriso quase choro

Foram os beijos que guardámos a gotejar saudades na palma das mãos vazias.


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