quarta-feira, 29 de agosto de 2007
Aviso à navegação...
Imaginário VII
Sempre a tinha fascinado o que estava do lado de lá. Sempre a tinha fascinado que ali fosse "o fim" mas não fosse. Que ali fosse o fim mas o início de algo - ela acreditava que o fim não era mais que um início.
A noite estava convidativa. A brisa quente aconchegava os sentidos e proporcionava viagens mentais a universos pouco explorados.
-Sabes? Devíamos ir buscar uma manta.
- Uma manta, agora? Para quê?
- Duas mantas. Devíamos ir buscar duas mantas. Uma para estendermos na areia. Outra para nos taparmos.
- Agora?
- Já!
Voltaram para trás em passo acelerado. Brincavam com a sombra longa projectada no chão. Iam de mãos dadas, ora ela puxando por ele, ora ele puxando por ela, riam enquanto corriam, como quando eram jovens.
-Lembras-te de nós? Aqui? Lembras-te? - perguntava ela enquanto ria.
Pegaram nas mantas e regressaram à praia, como se sempre tivesse sido lá o mundo deles.
Ela escolheu o lugar: ali no areal extenso onde para a frente só se via o mar e a luz que a lua projectava nele. Estenderam a manta, deitaram-se por cima e taparam-se com a outra. Só para estarem aconchegados, a olhar o céu.
Ele abraçou-a envolvendo-a nos seus braços e ela, sentindo-se protegida, pensou que o mundo não existia mais, só eles e aquele lugar.
Ali, debaixo do céu, das estrelas, da lua e com a música do mar fizeram amor e sentiram-se como nunca antes em tantos anos que se sentiram e entregaram.
Abraçados, debaixo da lua e das estrelas e do céu e com o mar a cantar a sua música aos seus pés foram um só e deixavam-se agora dormir.
-Esta foi a melhor noite da minha vida, sabias?
-Schhhh... esta é apenas uma das nossas melhores noites.
Sabor a Thunderlady
segunda-feira, 27 de agosto de 2007
Vivências... 08
- (1) Esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginado.
- (2) Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos, caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e desvalorização.
- (3) Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e resistente da auto-imagem ou do sentimento de self.
- (4) Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente prejudiciais à própria pessoa (por ex., gastos financeiros, sexo, abuso de substâncias, direcção imprudente, comer compulsivamente).
- (5) Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento automutilante.
- (6) Instabilidade afectiva devido a uma acentuada reactividade do humor (por ex., episódios de intensa disforia, irritabilidade ou ansiedade geralmente durando algumas horas e apenas raramente mais de alguns dias).
- (7) Sentimentos crónicos de vazio.
- (8) Raiva inadequada e intensa ou dificuldade em controlar a raiva (por ex., demonstrações frequentes de irritação, raiva constante, lutas corporais recorrentes).
- (9) Ideação paranóide transitória e relacionada ao stresse ou severos sintomas dissociativos.
Infelizmente Rute você preenche o critério 1, 2, 4, 6, 7 e 8...
- Pois... é verdade... mas sabe ainda o pior é mesmo o sentimento de vazio... Tem de me ajudar, porque há dias em que de facto tudo parece não fazer sentido algum...
- A vida, nem sempre faz sentido em muitos casos, mas julgo que a sua fará ainda menos sentido em alguns dias... Compreendo-a e estarei sempre ao seu lado para a acompanhar porque posso dizer-lhe desde já que esta vai ser uma longa jornada... Rute, há uma parte da "corrida" que eu a irei acompanhar mas, saiba que depois... Haverá, a dada altura uma parte do "caminho" que terá de ser você a fazer...
- E isso acha que vai custar?
- Sim! Vai!
- E se eu precisar de si, da sua ajuda posso telefonar?
- Pode! Mas em última análise, só você se poderá ajudar a si próprio... Ainda assim, estaremos cá! Não está sozinha!
- Sim, por favor, então faça-me esse favor... não me deixe... não sozinha!
quarta-feira, 22 de agosto de 2007
Imaginário VI
Aquelas imagens não lhe saíam da cabeça. Aqueles sons não lhe saíam da cabeça. Não sabia onde ir, não sabia o que fazer, não sabia o que queria ver – apenas precisava ir. Tinha que ir.
As lágrimas pesavam-lhe à beira dos olhos, grossas, pesadas, o esforço para que não rolassem era já demasiado. A garganta doía, o peito apertava, a respiração fugia. Não conseguia esquecer.
No fundo no fundo não queria nada. Não sabia se queria esquecer, não sabia onde queria ir, não sabia onde devia estar. Principalmente não sabia o que devia pensar e acima de tudo que não queria pensar mais. Não queria pensar nunca mais.
À medida que acelerava o prazer aumentava. Assim que entrou na autoestrada o limite era o do carro e nem esse interessava. Não interessava mais o que os outros poderiam pensar, não interessava mais o que os outros poderiam dizer, não interessava mais o que poderia acontecer – não interessava mais nada.
Conseguia ouvir as vozes a recriminarem o seu instinto de auto-destruição, como se compreendessem sequer o que se estava a passar e ria com plena consciência da aparente loucura que tinha a certeza que os outros viam em si.
E acelerava. Mais, cada vez mais.
Ria ao tentar explicar-lhes que não era auto-destruição, sabendo perfeitamente que quanto mais tentava explicar mais se riria, com a certeza que quanto mais tentasse explicar menos acreditariam mas nem isso interessava. Não interessava se não acreditavam que não era auto-destruição, não interessava se todos achavam que precisava ajuda, não interessava nada. Neste momento não interessava nada. Já nada interessava.
E ria do que conseguia ouvir nitidamente do que diziam e sabia perfeitamente que estava só: verdadeiramente só. E por isso nada importava, nem o que pensavam, nem o que diziam, nem o que queriam. Só interessava a velocidade e a busca de uma direcção, precisava ainda de encontrar a direcção. A velocidade cada vez maior já não satisfazia o suficiente.
Antes de embater violentamente no separador central pensou do que estaria a fugir. Era difícil admitir para si que estava a fugir. Lágrimas pesadas rolaram quando virou o retrovisor na sua direcção e tirando os olhos da estrada olhou para si olhos nos olhos e disse: "descobri que estou a fugir de ti"
Sabor a Thunderlady
segunda-feira, 20 de agosto de 2007
Vivências... 07
De novo: a si Xavier, que sei também, que não vai ler esta "Carta":
As férias não foram boas!
Talvez tenham sido um misto de adeus, dor, ausência e desespero.
Não interessa a causa, não interessam os actores em teatro tão deprimente... Foram então, o que tiveram de ser: um barco encalhado!
Gostava sinceramente, em ter cumprido, o seu amável desejo e portanto que elas fossem a execução se não do que se entende por "bom" pelo menos aquilo que descrevemos como aprazimento...
Assim, aqui fica uma descrição menos triste de um desses dias para não correr o risco de o enfastiar:
"Acordei todos os dias, com um sentimento profundo de descanso e de liberdade... como se o amanhecer permitisse o fazer-se tudo. Espreguicei-me prolongamente, quase não querendo sair dali.
O coração batia compassadamente e quase tão tranquilo como a minha alma... sorri. Olhei para o lado e ele estava ali, dormindo como sempre foi seu hábito, um pouco mais... Observei-o como todas as manhãs se deve observar o grande amor da nossa vida e, em em movimentos lentos, vesti-me e sai porta fora...
Chovia, um tipo de chuva mansa e miuda que fazia as crianças rirem e os mais velhos fugir. Coloquei as mãos nos bolsos, andei como se nada de facto me pudesse atingir e fui até à pastelaria mais perto...
Pedi o tal do café e ouvia sem querer as conversas alheias das vizinhas que não tinham vida própria... Voltei a sorrir... e creio, que teria na cara o tal ar estúpido de quem está de bem com a vida e com o mundo... pedi um café duplo, paguei e saí.
A chuva estava agora mais forte mas continuei de mãos nos bolsos impávida, serena como se nada fosse... Abri a porta, já estava acordado e beijo-me agradecendo silenciosamente o café que lhe trazia.
Permanecemos mais um tempo na cama observando-nos mutuamente... Ontem tinha chorado com medo de te perder, hoje já nada sentia para além da sua presença...
Beijámo-nos uma e outra vez, fizemos amor e pensei: "será a última vez!"...
Tomou banho como é habito e eu, como também é usual não!
Falámos acerca... e também...
Almoçamos, não recordo o quê!
Podíamos ter ficado ali sempre.
Podíamos apenas ficar numa espécie de semi-abraço a ler um dos livros que qualquer um de nós anda a ler...
Mas não.
Adeus, tenho coisas para fazer, sabes como é!
Adeus...
Não houve dia a seguir!
Xavier, já agora, não me leve a mal o desabafo mas, se pudesse: Não! Não voltaria ao trabalho!
sexta-feira, 17 de agosto de 2007
Ao vivo...?

“Olha, aqueles têm uma banda...”
Alguns amigos começam a assistir aos ensaios e a ouvir algumas gravações que são feitas com a aparelhagem do fundo da sala, com uma qualidade sofrível, onde mal se distingue cada instrumento, quanto mais perceber a voz, mas por força da amizade, ou por alguma outra razão, os amigos começam a gostar do que ouvem no meio do caos sonoro que sai das colunas. Amigos passam a amigos e quando dão conta, já muita gente conhece o som da banda e pergunta quando e onde os podem ver ao vivo...
“Ao vivo...?”
“Ainda não tinhamos pensado nisso, embora sonhássemos com isso...”

Sabor a Thunderdrum
quarta-feira, 15 de agosto de 2007
Imaginário V
De manhã acordou antes do despertador, ansiosa de saltar da cama, feliz por ter acordado, sorridente.
Um espreguiçar mais prolongado que o normal e levantou-se, dirigindo-se à janela. O sol a nascer proporcionava-lhe um espectáculo que raramente observava. Demorou-se com a mão na cortina a ver o crepúsculo transformar-se em dia e a ver aquela massa laranja erguer-se lentamente atrás da colina.
Enfiou-se no poliban e abriu a torneira arrepiando-se com o frio inicial da água que logo a seguir correu tépida pelo seu corpo abaixo.
Invariavelmente demorou-se a sentir a água na cabeça a correr pelo pescoço e costas, virou-se e sentiu a água na cara e pensou que raras eram as vezes em que aproveitava estes pequenos prazeres do dia-a-dia.
Ao sair do duche sabia exactamente o que lhe apetecia vestir. A roupa interior nova que a fazia sentir elegante, a camisa branca mais decotada que o normal, a saia travada exactamente pelo joelho. Hoje sentia-se elegante, firme, segura. Hoje era capaz de conquistar o mundo.
Secou o cabelo esticando-o. Pôs aqueles brincos que só usava em ocasiões especiais - e hoje, por algum motivo, sentia que era especial, maquilhou-se com mais cuidado, pegou na mala, pôs um pouco de comida no aquário do Zacarias, disse-lhe "até logo peixinho!" e saiu.
O dia estava lindo e a aragem amena acariciava-lhe a pele, e instintivamente ela fechava os olhos e respirava fundo, tentando absorver o cheiro da terra pela manhã.
Ela sentia-se confiante.
No caminho para o trabalho um telefonema:
- Bom dia...
- Bom dia! Tu? A esta hora?
- Sim, eu. Surpreendida?
- Bastante...
- Então vou surpreender-te outra vez...
- Sim?...
- Queres almoçar comigo?
Ela sentia-se confiante. Naquele dia que ela nunca mais vai esquecer conquistou um mundo: o seu.
Sabor a Thunderlady
segunda-feira, 13 de agosto de 2007
Vivências... 06
domingo, 12 de agosto de 2007
Rubrica "Ronda das Tascas"
Achei por bem começar com a cena que mais me irrita numa pessoa: Arrogância. Não há coisa que me tire mais do sério do que uma pessoa arrogante. Estou no país certo, sem dúvida…
Há uma linha muito ténue, pelo menos para mim, entre uma pessoa confiante e uma pessoa arrogante. Pessoas que acho arrogantes outras acham que é apenas uma demonstração de auto confiança.
Vejamos um exemplo (talvez um pouco exagerado, admito):
Um atleta antes de uma competição diz para ele mesmo, para o treinador, para os amigos: "Eu sou melhor que eles. Eu vou vencê-los. Eu consigo.", como que a mentalizar-se que vai conseguir. E depois da corrida diz: "Não foi fácil, muito trabalho, a concorrência foi forte, mas consegui, sou o melhor e estou feliz. Parabéns aos restantes atletas." Isto é confiança (inclui respeito pelo próximo).
Agora um atleta que diz a quem o quiser ouvir: "Vai ser fácil, eu sou bom, já ‘tou farto de vencer isto, eles são bons mas eu sou melhor." E depois de vencer diz: "Ah e tal, já ‘tou habituado, não é surpresa nenhuma, sou o maior, nao tiveram hipotese…" Bazuca! Rajada de metralhadora!
Lamento, mas um bocadinho de humildade nunca fez mal a ninguém! E irrita-me ainda mais os arrogantes que são tão arrogantes que nem se dão ao trabalho de disfarçar!
A história da autoconfiança… Bom, ja me apercebi que muitos arrogantes têm índices de auto-estima mínimos. Usam a arrogância como uma defesa. E isso não só os faz arrogantes, como também hipócritas.
A arrogância também é uma das características de uma pessoa que mais salta à vista. Uns minutinhos a falar com um arrogante, e vê-se logo. É nessa altura que arranjo uma desculpa qualquer e vou dar uma volta. E a partir do momento em que acho uma pessoa arrogante logo ao primeiro contacto, não há grande volta a dar.
É claro que todos somos um bocadinho arrogantes, de vez em quando. Somos humanos. Mas há pessoas que fazem disso um modo de vida e essas não suporto.
Eu própria tenho momentos de arrogância. Talvez o esteja a ser neste momento, para algumas pessoas, mas o tipo de arrogância de que estou a falar é aquela que diminui os outros. Para mim a grande diferença é diminuir os outros gratuitamente. Uma coisa é não ligar a ataques pessoais, ignorar por se achar acima desse tipo de comportamentos, outra é partir do princípio que se é melhor que todos os outros e que se está a marimbar para opiniões alheias. Uma coisa é ter orgulho no seu país e na sua nacionalidade. Outra é pensar que todos os outros são piores e inferiores.
Enfim, irrita-me. As opiniões divergem e como há coisas que me irritam a mim e não aos outros tal como o som dum corta unhas, há outras que me passam ao lado e são insuportáveis para os outros, como unhas a arranhar um quadro…
Nota: Este post descreve as opiniões da autora com o objectivo de aliviar tensões. Os restantes contribuintes deste blog não são, de todo, responsáveis pelas baboseiras que para aqui escrevo. E para que nao haja dúvidas é melhor pôr esta nota em todos os posts ☺
Agradeço à Thunderlady pelos acentos, antes que me irritasse ainda mais por andar à procura de códigos.
Sabor a A Ronda das Tascas
quarta-feira, 8 de agosto de 2007
Imaginário IV
Nunca percebeu porquê.
Ele lembra-se de ser criança, pequenino, e a avó lhe dizer que se fosse um menino bonito e desse um beijinho aos papás e se fosse deitar cedo ela lhe ia contar uma história.
Então ele dava um beijinho e pedia a bênção à família e ia para o quarto, acendia o candeeiro, dizia as suas orações e esperava pela avó, que logo de seguida chegava para se sentar à beira da cama.
Recorda-se que todas as histórias começavam com "Era uma vez..." e que normalmente, a seguir, vinha "um menino" ou "uma menina", "muito pobrezinho" (ou pobrezinha).
Antes de se sentar a avó aconchegava os cobertores e os lençóis. Fazia-lhe sempre uma festinha na testa, como que a tirar a franja dos olhos. Aconchegava-lhe o urso de peluche já remendado mas ainda assim o seu companheiro inseparável das noites de pesadelos.
A avó pegava então no livro.
"Era uma vez uma menina, uma menina muito pobrezinha, que não tinha sapatos, não tinha brinquedos, não tinha amigos..."
Ele recorda que gostava que a história começasse pela menina. Um dia perguntou porque é que a menina era muito pobrezinha e a avó respondeu que havia muitos meninos muito pobrezinhos e que ele devia ouvir a história até ao fim.
Quando a avó chegava à parte do príncipe ele imaginava-se num fato galante de veludo, em vários tons de azul, com calções em balão por cima de collants e uma capa ao pescoço, que era fina e esvoaçava à mínima brisa e lá ia ele, em cima do seu cavalo "Veloz", salvar a menina pobrezinha e acabavam a viver os dois felizes para sempre.
"Era uma vez uma menina, uma menina muito pobrezinha, que não tinha sapatos, não tinha brinquedos, não tinha amigos e não podia ir à escola. A menina tinha que trabalhar no campo com os pais, que gostavam muito dela e tinham muita pena que a menina não pudesse ir aprender a ler."
Ele imaginava-se a salvar a menina, e ir com ela à escola, e seriam inseparáveis. Eles iam crescer e iam gostar muito um do outro, como o avô e a avó, como o papá e a mamã, e iam casar e iam ser felizes para sempre.
Ele lembra-se de ser criança e do cheiro dos bolos da avó, e de a mãe lhe cerzir as peúgas, sentada à lareira na cadeira de baloiço enquanto o pai lutava para vencer o cansaço e ler mais uma notícia, atrasada, do jornal. Lembra-se das visitas das tias que vinham da serra e traziam queijos e chouriças e lã que a mãe usava para fazer camisolas e pantufas. Lembra-se de o pai o ensinar a andar de bicicleta no jardim em frente à casa e de não o deixar cair.
Ele lembra-se de perguntar à avó porque é que as histórias do livro eram sempre tão parecidas, e quando a avó lhe dizia para ele ouvir com atenção ele nem se lembrava mais da história anterior, porque a avó magnetizava-o.
Ele lembra-se de ir crescendo e aprender a ler e de abrir o livro e não serem aquelas as histórias que ele ouvia. Ele não gostava das histórias do livro. Lembra-se que nunca disse nada à avó que sabia que ela não sabia ler. Lembra-se de sentir que o importante não eram as histórias, era a avó.
Ele lembra-se que todas as histórias começavam com "Era uma vez..." e terminavam com "... e foram felizes para sempre."
E tentava imaginar o que era ser feliz para sempre, e adormecia a pensar na felicidade que ia ter com a princesa que ia salvar... para sempre.
Agora, à beira da cama, a olhar para a sua princesa, ele sabe que a avó tinha razão e sabe porque é que todas as histórias começam com "Era uma vez..." e terminam com "... e foram felizes para sempre."
E foram felizes para sempre...
Sabor a Thunderlady
segunda-feira, 6 de agosto de 2007
Vivências 05...
sexta-feira, 3 de agosto de 2007
Caos

A ânsia de mostrar o que cada um já sabe fazer mistura-se com a vontade de tocar e o resultado é tudo menos música. Não há organização, essencial para construir uma banda, é cada um por si. O baterista (ou quem pelo menos está sentado por detrás da bateria) não consegue estar quieto e faz mais barulho que todos os outros juntos, as guitarras parecem nunca se entenderem, o baixo pouco ou nada se ouve e a voz(?) berra e grita, tentando passar por cima da amálgama sonora dos outros instrumentos.
Quase todo o Verão dentro da cave, quase todos os dias a tocar, ou a tentar tocar, e não se vislumbra um indício de qualquer coisa a que se possa chamar música. Para tentar evoluir da melhor forma, começam por tentar copiar as músicas preferidas dos seus ídolos de adolescentes. Aos poucos, parece que vão percebendo como se faz e como é suposto fazer e alguns acordes já soam parecidos com os que ouvem vindos da aparelhagem instalada no fundo da sala. Uma e outra música que se desconstrói e se constrói novamente, até que o resultado final é uma pequena reconstrução de uma obra que eles conhecem, tocada por alguém que admiram imenso e desejam ser. Esta evolução permite-lhes sonhar, pensar que um dia podem tocar como esses ídolos, esses “seres” que parecem tão distantes mas agora mais perto.
Agora já existe alguma organização, já todos conhecem bem o seu papel e o que têm que fazer, as músicas nascem e crescem, o processo de composição evoluiu para um ponto onde já conseguem criar música, em vez de a imitarem...com alguma facilidade, as músicas ganham identidade, consistência e uma vida própria.
Sabor a Thunderdrum
quarta-feira, 1 de agosto de 2007
Imaginário III
Passou a mesma entrada principal que, num ritual indesejado de tempo perdido na longa fila de espera, cruzava há coisa de 4 anos. As caras, apesar de diferentes, espelham todas os mesmos sentimentos. Conversas mais sorridentes, olhos mais lacrimejantes, mas as vivências, mais tarde ou mais cedo, comuns a todos - só uma questão de tempo.
Naquele dia estava sol. Reparava agora que a maioria das vezes que lá tinha ido até aquela altura tinha chovido. Ultimamente estava sol e perguntava-se se seria bom augúrio.
Passada a entrada principal o mesmo encontro com o segurança, as perguntas de sempre: "onde vai?" "sabe o caminho?" e a resposta a todas já sem pensar porque parecia já uma rotina, mesmo que se passasse mais de 6 meses sem lá ir.
No início do que se tornaria um hábito, uma componente da vida, virava à esquerda passando o segurança. Quando passou a virar à direita para se dirigir ao segundo andar o seu entusiasmo melhorou.
Agora, na sala de espera onde se habituou a esperar calmamente pela sua vez, silenciosa, iluminada, aprazível até, olhava para as caras que já não sabe se conhece ou não com uma vontade de dizer "bom dia, como vai?" mas que não faz por receio nem sabe bem de quê mas prefere não fazer.
Tanto a sua própria experiência pessoal como o conhecimento do ritual do lugar faz com que olhe para as caras e saiba o que estão a pensar. E se umas tem vontade de abraçar, oferecer o ombro e todo o tempo do mundo e dizer que vai correr tudo bem, com outras tem vontade de felicitar e "despedir" (porque nunca se sabe em que esquina vamos encontrar quem...) e outras ainda tem vontade de explicar tudo tim-tim por tim-tim e dizer que o mais importante é mesmo saber esperar, como se tudo isto fosse um desígnio maior para pôr à prova a capacidade de espera e de controlo da pessoa.
Chega a sua vez. Cruza olhares com duas ou três expressões que também conhecem a sua. Respirar fundo, sorrir e seguir.
Sem dar conta muito tempo passou até que pudesse sorrir. E até que pudesse ter aquele sorriso naquele sítio.
Sabor a Thunderlady