quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Aviso à navegação...


Por motivos de maior, o meu blog (She Hate Me) passou a ser restricto, lamento mas, teve de ser, entretanto se eu me esquecer de convidar alguém podem sempre contactar-me para o: me.hate76@gmail.com e pedirem-me acesso.
Obrigada pela compreensão desde já.

Imaginário VII

Aquela noite estava quente. Saíram de mãos dadas de casa, desceram a vila e foram até à praia, foram até "ao fim", até onde já não se ia mais para além, a não ser de barco.

Sempre a tinha fascinado o que estava do lado de lá. Sempre a tinha fascinado que ali fosse "o fim" mas não fosse. Que ali fosse o fim mas o início de algo - ela acreditava que o fim não era mais que um início.

A noite estava convidativa. A brisa quente aconchegava os sentidos e proporcionava viagens mentais a universos pouco explorados.

-Sabes? Devíamos ir buscar uma manta.
- Uma manta, agora? Para quê?
- Duas mantas. Devíamos ir buscar duas mantas. Uma para estendermos na areia. Outra para nos taparmos.
- Agora?
- Já!

Voltaram para trás em passo acelerado. Brincavam com a sombra longa projectada no chão. Iam de mãos dadas, ora ela puxando por ele, ora ele puxando por ela, riam enquanto corriam, como quando eram jovens.

-Lembras-te de nós? Aqui? Lembras-te? - perguntava ela enquanto ria.

Pegaram nas mantas e regressaram à praia, como se sempre tivesse sido lá o mundo deles.

Ela escolheu o lugar: ali no areal extenso onde para a frente só se via o mar e a luz que a lua projectava nele. Estenderam a manta, deitaram-se por cima e taparam-se com a outra. Só para estarem aconchegados, a olhar o céu.

Ele abraçou-a envolvendo-a nos seus braços e ela, sentindo-se protegida, pensou que o mundo não existia mais, só eles e aquele lugar.

Ali, debaixo do céu, das estrelas, da lua e com a música do mar fizeram amor e sentiram-se como nunca antes em tantos anos que se sentiram e entregaram.

Abraçados, debaixo da lua e das estrelas e do céu e com o mar a cantar a sua música aos seus pés foram um só e deixavam-se agora dormir.

-Esta foi a melhor noite da minha vida, sabias?
-Schhhh... esta é apenas uma das nossas melhores noites.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Vivências... 08


- Quanto tempo ainda me resta?
- Nenhum, ou todo se você decidir! A doença está lá, já se instalou... a única coisa que agora poderá fazer é tomar a sua medicação e tentar minorar alguns dos comportamentos com terapia adequada...
- Mas tem a certeza que sofro mesmo disso?
- Oiça Rute você preenche 6 dos 9 critérios. E para se sofrer deste transtorno em particular, você só precisava de preencher entre 4 a 5...
-Mas então diga lá todos... pode não ser, pode não ser bem isso...
- Passo a dizer-lhe todos os Critérios de Diagnóstico para Transtorno da Personalidade Borderline... e depois então digo-lhe dos quais você... sofre...
Você já concordou que tem aquilo que chamamos um padrão invasivo de instabilidade dos relacionamentos interpessoais, auto-imagem e afectos com uma acentuada impulsividade, que começou no início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos, verdade?
- Sim mas...
- Então oiça, os critérios são estes:
  • (1) Esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginado.
  • (2) Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos, caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e desvalorização.
  • (3) Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e resistente da auto-imagem ou do sentimento de self.
  • (4) Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente prejudiciais à própria pessoa (por ex., gastos financeiros, sexo, abuso de substâncias, direcção imprudente, comer compulsivamente).
  • (5) Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento automutilante.
  • (6) Instabilidade afectiva devido a uma acentuada reactividade do humor (por ex., episódios de intensa disforia, irritabilidade ou ansiedade geralmente durando algumas horas e apenas raramente mais de alguns dias).
  • (7) Sentimentos crónicos de vazio.
  • (8) Raiva inadequada e intensa ou dificuldade em controlar a raiva (por ex., demonstrações frequentes de irritação, raiva constante, lutas corporais recorrentes).
  • (9) Ideação paranóide transitória e relacionada ao stresse ou severos sintomas dissociativos.

Infelizmente Rute você preenche o critério 1, 2, 4, 6, 7 e 8...

- Pois... é verdade... mas sabe ainda o pior é mesmo o sentimento de vazio... Tem de me ajudar, porque há dias em que de facto tudo parece não fazer sentido algum...

- A vida, nem sempre faz sentido em muitos casos, mas julgo que a sua fará ainda menos sentido em alguns dias... Compreendo-a e estarei sempre ao seu lado para a acompanhar porque posso dizer-lhe desde já que esta vai ser uma longa jornada... Rute, há uma parte da "corrida" que eu a irei acompanhar mas, saiba que depois... Haverá, a dada altura uma parte do "caminho" que terá de ser você a fazer...

- E isso acha que vai custar?

- Sim! Vai!

- E se eu precisar de si, da sua ajuda posso telefonar?

- Pode! Mas em última análise, só você se poderá ajudar a si próprio... Ainda assim, estaremos cá! Não está sozinha!

- Sim, por favor, então faça-me esse favor... não me deixe... não sozinha!

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Imaginário VI

Entrou no carro e ligou-o. Sabia que precisava ir – a algum sítio – sabia que tinha que ir. Estaria a fugir? Interrogava-se se estaria a fugir. Provavelmente. Era tão difícil… não sabia quanto tempo mais iria aguentar fugir – fugir do mundo.

Aquelas imagens não lhe saíam da cabeça. Aqueles sons não lhe saíam da cabeça. Não sabia onde ir, não sabia o que fazer, não sabia o que queria ver – apenas precisava ir. Tinha que ir.

As lágrimas pesavam-lhe à beira dos olhos, grossas, pesadas, o esforço para que não rolassem era já demasiado. A garganta doía, o peito apertava, a respiração fugia. Não conseguia esquecer.

No fundo no fundo não queria nada. Não sabia se queria esquecer, não sabia onde queria ir, não sabia onde devia estar. Principalmente não sabia o que devia pensar e acima de tudo que não queria pensar mais. Não queria pensar nunca mais.

À medida que acelerava o prazer aumentava. Assim que entrou na autoestrada o limite era o do carro e nem esse interessava. Não interessava mais o que os outros poderiam pensar, não interessava mais o que os outros poderiam dizer, não interessava mais o que poderia acontecer – não interessava mais nada.

Conseguia ouvir as vozes a recriminarem o seu instinto de auto-destruição, como se compreendessem sequer o que se estava a passar e ria com plena consciência da aparente loucura que tinha a certeza que os outros viam em si.
E acelerava. Mais, cada vez mais.

Ria ao tentar explicar-lhes que não era auto-destruição, sabendo perfeitamente que quanto mais tentava explicar mais se riria, com a certeza que quanto mais tentasse explicar menos acreditariam mas nem isso interessava. Não interessava se não acreditavam que não era auto-destruição, não interessava se todos achavam que precisava ajuda, não interessava nada. Neste momento não interessava nada. Já nada interessava.

E ria do que conseguia ouvir nitidamente do que diziam e sabia perfeitamente que estava só: verdadeiramente só. E por isso nada importava, nem o que pensavam, nem o que diziam, nem o que queriam. Só interessava a velocidade e a busca de uma direcção, precisava ainda de encontrar a direcção. A velocidade cada vez maior já não satisfazia o suficiente.

Antes de embater violentamente no separador central pensou do que estaria a fugir. Era difícil admitir para si que estava a fugir. Lágrimas pesadas rolaram quando virou o retrovisor na sua direcção e tirando os olhos da estrada olhou para si olhos nos olhos e disse: "descobri que estou a fugir de ti"



segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Vivências... 07


"Dra. Luísa boas férias e volte depressa."
17/08/2007
A si, Xavier que por esta hora já sabe que não vou regressar (pelo menos, não na celeridade que desejava):
(Ao leitor desprevenido e/ou insensível, esta carta não deve ser lida em forma de queixume, tristeza ou sequer como: "Oh pobre de mim tenham lá um pouco de compaixão". Para que fique, bem claro: MERDA para tudo isso, para todas essas pessoas e para quem julga que tem em si o dom da verdade... da dor e de mais não sei o quê!
O espírito das cartas há muito perdido, sempre me deu prazer e aqui reencontrei-o muitas vezes. Nas cartas que EU escrevia-a nunca perguntei o banal "Estás bem?" ou o bacoco "Gostava de estar contigo!". As cartas que escrevi e as que sempre recebi, reduziram-se sempre a descrever os dias que passavam muito mais lentos, certamente, sem presença daquela pessoa, fosse amigo, parente ou amante... Espantem-se os tolos, ainda as escrevo ainda a as recebo e são dos poucos momentos privados que guardo com o mais profundo dos carinhos.)

De novo: a si Xavier, que sei também, que não vai ler esta "Carta":

As férias não foram boas!

Talvez tenham sido um misto de adeus, dor, ausência e desespero.

Não interessa a causa, não interessam os actores em teatro tão deprimente... Foram então, o que tiveram de ser: um barco encalhado!

Gostava sinceramente, em ter cumprido, o seu amável desejo e portanto que elas fossem a execução se não do que se entende por "bom" pelo menos aquilo que descrevemos como aprazimento...

Assim, aqui fica uma descrição menos triste de um desses dias para não correr o risco de o enfastiar:

"Acordei todos os dias, com um sentimento profundo de descanso e de liberdade... como se o amanhecer permitisse o fazer-se tudo. Espreguicei-me prolongamente, quase não querendo sair dali.

O coração batia compassadamente e quase tão tranquilo como a minha alma... sorri. Olhei para o lado e ele estava ali, dormindo como sempre foi seu hábito, um pouco mais... Observei-o como todas as manhãs se deve observar o grande amor da nossa vida e, em em movimentos lentos, vesti-me e sai porta fora...

Chovia, um tipo de chuva mansa e miuda que fazia as crianças rirem e os mais velhos fugir. Coloquei as mãos nos bolsos, andei como se nada de facto me pudesse atingir e fui até à pastelaria mais perto...

Pedi o tal do café e ouvia sem querer as conversas alheias das vizinhas que não tinham vida própria... Voltei a sorrir... e creio, que teria na cara o tal ar estúpido de quem está de bem com a vida e com o mundo... pedi um café duplo, paguei e saí.

A chuva estava agora mais forte mas continuei de mãos nos bolsos impávida, serena como se nada fosse... Abri a porta, já estava acordado e beijo-me agradecendo silenciosamente o café que lhe trazia.

Permanecemos mais um tempo na cama observando-nos mutuamente... Ontem tinha chorado com medo de te perder, hoje já nada sentia para além da sua presença...

Beijámo-nos uma e outra vez, fizemos amor e pensei: "será a última vez!"...

Tomou banho como é habito e eu, como também é usual não!

Falámos acerca... e também...

Almoçamos, não recordo o quê!

Podíamos ter ficado ali sempre.

Podíamos apenas ficar numa espécie de semi-abraço a ler um dos livros que qualquer um de nós anda a ler...

Mas não.

Adeus, tenho coisas para fazer, sabes como é!

Adeus...

Não houve dia a seguir!

Xavier, já agora, não me leve a mal o desabafo mas, se pudesse: Não! Não voltaria ao trabalho!

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Ao vivo...?

Música com qualidade ou não, a verdade é que a banda começa a ser conhecida, quer seja na escola, no bairro ou nos cafés...quando se encontram ouvem por vezes:
“Olha, aqueles têm uma banda...”
Alguns amigos começam a assistir aos ensaios e a ouvir algumas gravações que são feitas com a aparelhagem do fundo da sala, com uma qualidade sofrível, onde mal se distingue cada instrumento, quanto mais perceber a voz, mas por força da amizade, ou por alguma outra razão, os amigos começam a gostar do que ouvem no meio do caos sonoro que sai das colunas. Amigos passam a amigos e quando dão conta, já muita gente conhece o som da banda e pergunta quando e onde os podem ver ao vivo...
“Ao vivo...?”
“Ainda não tinhamos pensado nisso, embora sonhássemos com isso...”


Os preparativos para um primeiro concerto ao vivo começam a ser feitos. Contactar outra banda para saber da hipótese de tocarem juntos, o local onde acontecerá, quantas e quais as músicas a tocar, como se vai fazer a publicidade, etc...

Os ensaios começam a ser levados mais a sério, numa tentativa de aperfeiçoar o que foi feito até agora e de modo a não haver grandes falhas no momento de se apresentarem perante (algum) público. As músicas a tocar são escolhidas, a ordem das mesmas em palco e até a entrada em palco é cuidadosamente estudada...

O modo como se apresentam ao público no primeiro concerto é muito importante, quer pela boa impressão que querem (devem) mostrar à assistência, quer pela confiança que se torna necessária de transportar para futuros concertos. Os nervos aumentam na proporção inversa em que a data se aproxima e já nem conseguem pensar noutra coisa, as músicas são mais uma vez dissecadas e estudadas ao pormenor para assegurar uma boa prestação de todos os elementos. Detalhes como quantas pessoas vão estar presentes, quanto dinheiro poderão ganhar (se é que irão ganhar algum) e a quantidade de alcóol que terão para beber, assumem um papel secundário nesta experiência...


Chegou o momento mais esperado, o dia do concerto ao vivo...

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Imaginário V

Naquele dia ela saiu de casa confiante, sentia-se capaz de conquistar o mundo.

De manhã acordou antes do despertador, ansiosa de saltar da cama, feliz por ter acordado, sorridente.

Um espreguiçar mais prolongado que o normal e levantou-se, dirigindo-se à janela. O sol a nascer proporcionava-lhe um espectáculo que raramente observava. Demorou-se com a mão na cortina a ver o crepúsculo transformar-se em dia e a ver aquela massa laranja erguer-se lentamente atrás da colina.

Enfiou-se no poliban e abriu a torneira arrepiando-se com o frio inicial da água que logo a seguir correu tépida pelo seu corpo abaixo.

Invariavelmente demorou-se a sentir a água na cabeça a correr pelo pescoço e costas, virou-se e sentiu a água na cara e pensou que raras eram as vezes em que aproveitava estes pequenos prazeres do dia-a-dia.

Ao sair do duche sabia exactamente o que lhe apetecia vestir. A roupa interior nova que a fazia sentir elegante, a camisa branca mais decotada que o normal, a saia travada exactamente pelo joelho. Hoje sentia-se elegante, firme, segura. Hoje era capaz de conquistar o mundo.

Secou o cabelo esticando-o. Pôs aqueles brincos que só usava em ocasiões especiais - e hoje, por algum motivo, sentia que era especial, maquilhou-se com mais cuidado, pegou na mala, pôs um pouco de comida no aquário do Zacarias, disse-lhe "até logo peixinho!" e saiu.

O dia estava lindo e a aragem amena acariciava-lhe a pele, e instintivamente ela fechava os olhos e respirava fundo, tentando absorver o cheiro da terra pela manhã.

Ela sentia-se confiante.

No caminho para o trabalho um telefonema:

- Bom dia...
- Bom dia! Tu? A esta hora?
- Sim, eu. Surpreendida?
- Bastante...
- Então vou surpreender-te outra vez...
- Sim?...
- Queres almoçar comigo?

Ela sentia-se confiante. Naquele dia que ela nunca mais vai esquecer conquistou um mundo: o seu.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Vivências... 06


"Sinto um conflito interno e nem sempre estou em paz com ele..."
A Sónia sente-se nessa espiral de dor faz tempo...
Não sabe se consegue viver fora das 4 paredes de uma cela e, ainda hoje sem querer chama o seu quarto na residência de "cela"... ri logo de seguida mas continua nervoso...
Falámos acerca do amor e o que é a liberdade e hoje, foi a minha vez de "dar" uma "lição", quando a Sónia diz:
- "É triste quando temos medo de viver não é? Acha que isso faz de mim uma pessoa menor?"
- Não Sónia, não faz de si pessoa menor... mas faz de si uma pequena cobarde... a segurança de uma cela é de facto um lugar que num primeiro momento parece simpático mas, quando espreitamos pelo meio das grades a vida lá fora não lhe parece muito maior?
- "Pois parece e quero muito vivê-la..."
- É só preciso dar o primeiro passo... o resto garanto-lhe, que vem sem esforço, logo de seguida...

domingo, 12 de agosto de 2007

Rubrica "Ronda das Tascas"

Cenas que me irritam (1) , autoria e contribuição de Catarina, www.sexyforeignwoman.com

Achei por bem começar com a cena que mais me irrita numa pessoa: Arrogância. Não há coisa que me tire mais do sério do que uma pessoa arrogante. Estou no país certo, sem dúvida…

Há uma linha muito ténue, pelo menos para mim, entre uma pessoa confiante e uma pessoa arrogante. Pessoas que acho arrogantes outras acham que é apenas uma demonstração de auto confiança.

Vejamos um exemplo (talvez um pouco exagerado, admito):

Um atleta antes de uma competição diz para ele mesmo, para o treinador, para os amigos: "Eu sou melhor que eles. Eu vou vencê-los. Eu consigo.", como que a mentalizar-se que vai conseguir. E depois da corrida diz: "Não foi fácil, muito trabalho, a concorrência foi forte, mas consegui, sou o melhor e estou feliz. Parabéns aos restantes atletas." Isto é confiança (inclui respeito pelo próximo).

Agora um atleta que diz a quem o quiser ouvir: "Vai ser fácil, eu sou bom, já ‘tou farto de vencer isto, eles são bons mas eu sou melhor." E depois de vencer diz: "Ah e tal, já ‘tou habituado, não é surpresa nenhuma, sou o maior, nao tiveram hipotese…" Bazuca! Rajada de metralhadora!

Lamento, mas um bocadinho de humildade nunca fez mal a ninguém! E irrita-me ainda mais os arrogantes que são tão arrogantes que nem se dão ao trabalho de disfarçar!
A história da autoconfiança… Bom, ja me apercebi que muitos arrogantes têm índices de auto-estima mínimos. Usam a arrogância como uma defesa. E isso não só os faz arrogantes, como também hipócritas.

A arrogância também é uma das características de uma pessoa que mais salta à vista. Uns minutinhos a falar com um arrogante, e vê-se logo. É nessa altura que arranjo uma desculpa qualquer e vou dar uma volta. E a partir do momento em que acho uma pessoa arrogante logo ao primeiro contacto, não há grande volta a dar.

É claro que todos somos um bocadinho arrogantes, de vez em quando. Somos humanos. Mas há pessoas que fazem disso um modo de vida e essas não suporto.

Eu própria tenho momentos de arrogância. Talvez o esteja a ser neste momento, para algumas pessoas, mas o tipo de arrogância de que estou a falar é aquela que diminui os outros. Para mim a grande diferença é diminuir os outros gratuitamente. Uma coisa é não ligar a ataques pessoais, ignorar por se achar acima desse tipo de comportamentos, outra é partir do princípio que se é melhor que todos os outros e que se está a marimbar para opiniões alheias. Uma coisa é ter orgulho no seu país e na sua nacionalidade. Outra é pensar que todos os outros são piores e inferiores.

Enfim, irrita-me. As opiniões divergem e como há coisas que me irritam a mim e não aos outros tal como o som dum corta unhas, há outras que me passam ao lado e são insuportáveis para os outros, como unhas a arranhar um quadro…


Nota: Este post descreve as opiniões da autora com o objectivo de aliviar tensões. Os restantes contribuintes deste blog não são, de todo, responsáveis pelas baboseiras que para aqui escrevo. E para que nao haja dúvidas é melhor pôr esta nota em todos os posts ☺

Agradeço à Thunderlady pelos acentos, antes que me irritasse ainda mais por andar à procura de códigos.

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Imaginário IV

"Era uma vez", começava assim a história. Começava assim porque todas as histórias têm que começar por "era uma vez".

Nunca percebeu porquê.

Ele lembra-se de ser criança, pequenino, e a avó lhe dizer que se fosse um menino bonito e desse um beijinho aos papás e se fosse deitar cedo ela lhe ia contar uma história.

Então ele dava um beijinho e pedia a bênção à família e ia para o quarto, acendia o candeeiro, dizia as suas orações e esperava pela avó, que logo de seguida chegava para se sentar à beira da cama.

Recorda-se que todas as histórias começavam com "Era uma vez..." e que normalmente, a seguir, vinha "um menino" ou "uma menina", "muito pobrezinho" (ou pobrezinha).

Antes de se sentar a avó aconchegava os cobertores e os lençóis. Fazia-lhe sempre uma festinha na testa, como que a tirar a franja dos olhos. Aconchegava-lhe o urso de peluche já remendado mas ainda assim o seu companheiro inseparável das noites de pesadelos.

A avó pegava então no livro.

"Era uma vez uma menina, uma menina muito pobrezinha, que não tinha sapatos, não tinha brinquedos, não tinha amigos..."

Ele recorda que gostava que a história começasse pela menina. Um dia perguntou porque é que a menina era muito pobrezinha e a avó respondeu que havia muitos meninos muito pobrezinhos e que ele devia ouvir a história até ao fim.

Quando a avó chegava à parte do príncipe ele imaginava-se num fato galante de veludo, em vários tons de azul, com calções em balão por cima de collants e uma capa ao pescoço, que era fina e esvoaçava à mínima brisa e lá ia ele, em cima do seu cavalo "Veloz", salvar a menina pobrezinha e acabavam a viver os dois felizes para sempre.

"Era uma vez uma menina, uma menina muito pobrezinha, que não tinha sapatos, não tinha brinquedos, não tinha amigos e não podia ir à escola. A menina tinha que trabalhar no campo com os pais, que gostavam muito dela e tinham muita pena que a menina não pudesse ir aprender a ler."

Ele imaginava-se a salvar a menina, e ir com ela à escola, e seriam inseparáveis. Eles iam crescer e iam gostar muito um do outro, como o avô e a avó, como o papá e a mamã, e iam casar e iam ser felizes para sempre.

Ele lembra-se de ser criança e do cheiro dos bolos da avó, e de a mãe lhe cerzir as peúgas, sentada à lareira na cadeira de baloiço enquanto o pai lutava para vencer o cansaço e ler mais uma notícia, atrasada, do jornal. Lembra-se das visitas das tias que vinham da serra e traziam queijos e chouriças e lã que a mãe usava para fazer camisolas e pantufas. Lembra-se de o pai o ensinar a andar de bicicleta no jardim em frente à casa e de não o deixar cair.

Ele lembra-se de perguntar à avó porque é que as histórias do livro eram sempre tão parecidas, e quando a avó lhe dizia para ele ouvir com atenção ele nem se lembrava mais da história anterior, porque a avó magnetizava-o.

Ele lembra-se de ir crescendo e aprender a ler e de abrir o livro e não serem aquelas as histórias que ele ouvia. Ele não gostava das histórias do livro. Lembra-se que nunca disse nada à avó que sabia que ela não sabia ler. Lembra-se de sentir que o importante não eram as histórias, era a avó.

Ele lembra-se que todas as histórias começavam com "Era uma vez..." e terminavam com "... e foram felizes para sempre."

E tentava imaginar o que era ser feliz para sempre, e adormecia a pensar na felicidade que ia ter com a princesa que ia salvar... para sempre.

Agora, à beira da cama, a olhar para a sua princesa, ele sabe que a avó tinha razão e sabe porque é que todas as histórias começam com "Era uma vez..." e terminam com "... e foram felizes para sempre."

E foram felizes para sempre...

segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Vivências 05...



"Não queria que ele fosse embora... Se for Dra. não sei se aguento!"


O longo periodo em que me olhou nos olhos sem desviar o olhar, não me perturbou, não me ameaçou, nem me deixou cosntrangida... Mas a cada milesimo de segundo sentia que o controlo facial a desvanecer-se, a transpiração das mãos a aumentar e os olhos num crescendo...


Ravel entrou em cena e aquilo que terá começado como uma pequena manifestação de humor liquido peuniforme e repetitiva, teve um crescendo progressivo e creio que, estaria prestes a acabar em mi maior, não fora o ardiloso bocejar e creio que não o conseguiria ter enganado...


"Se ainda agora o encontrei, porque raio é que tem de partir e ir para tão longe..."


O Duarte chorava em larghissimo pranto e as unicas palavras que conseguia-a pronunciar a dada altura eram: "Não quero, quero mesmo!"


E como eu no meio da torrente compreendia aquela mágoa, aquela aflição, aquele imenso pesar...


"Acalme-se - pedi-lhe passado um pouco - não podemos prender as pessoas. Elas são donas de si como nós, somos senhores de nós e do nosso destino. Aliás quanto mais as prendemos, mais a perdemos... Prepare-se para o inevitável, para a dor, para o vazio... Disse-lhe tudo o que sempre quis? Lutou para que ficasse? Então está na altura de relaxar os musculos da mão e largar, deixar livre, enfim, ceder..."


"Você não percebe... não pode compreender, eu gosto tanto dele, estivemos separados tanto tempo e este reencontro agora soube a todos os Invernos, todos os Verões que não passamos juntos, todas as palavras que não partilhamos, todos os beijos e abraços que nunca demos e agora... perde-lo assim desta forma... então porquê este reencontro, para quê?"


Ele não sabia o quanto bem eu o compreendia... nesse dia também não ficou a perceber...


"Tem razão, não sei o que sente... Não sou sou você e não vivi essa relação... Não significa que não tenha razão em tudo o que lhe disse... A cicatriz cicatrizará... e você seguirá em frente."


Menti-lhe obviamente... este é o obvio tipo de cicatriz que não o é! É uma úlcera que sempre teimará em não fechar e que, não impedindo a vida, torna-a mais dificil, menos suportável... mas a palavras ressoam de novo: tem de largar, tem de ser... se voltar, é porque será seu...


A chaga mantem apenas uma coisa viva em nós: a noção de que se sentimos dor, estamos certamente vivos... podemos é não compreender que tipo de vida é essa...


O Duarte tem 33 anos e esteve durante 26 anos separado daquele que é um grande amor seu: o seu pai pelas razões menos obvias, o pai esteve anos a fazer trabalho humanitário no estranjeiro e voltou há coisa de 1 ano... Irá partir hoje para a Mauritânia e o Manuel não pode ir porque não está bem mas, não quer também perder aquele homem de quem durante tanto tempo nunca conheceu sequer cheiro...


É dificil perder cheiros, sobretudo quando estão aliados ao Amor...

É dificil perder...

Mas há que largar, se voltar terá de voltar porque o Duarte é mais importante do que qualquer missão, do que qualquer ponderação interna... de que isto ou aquilo é o mais certo!
Se fores o seu grande Amor, como tu é sentes, então Duarte, nada temas: Voltará! Voltará sim! Anseio é que não seja depois, tarde demais...

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Caos

Os ensaios são o Caos.

A ânsia de mostrar o que cada um já sabe fazer mistura-se com a vontade de tocar e o resultado é tudo menos música. Não há organização, essencial para construir uma banda, é cada um por si. O baterista (ou quem pelo menos está sentado por detrás da bateria) não consegue estar quieto e faz mais barulho que todos os outros juntos, as guitarras parecem nunca se entenderem, o baixo pouco ou nada se ouve e a voz(?) berra e grita, tentando passar por cima da amálgama sonora dos outros instrumentos.

Quase todo o Verão dentro da cave, quase todos os dias a tocar, ou a tentar tocar, e não se vislumbra um indício de qualquer coisa a que se possa chamar música. Para tentar evoluir da melhor forma, começam por tentar copiar as músicas preferidas dos seus ídolos de adolescentes. Aos poucos, parece que vão percebendo como se faz e como é suposto fazer e alguns acordes já soam parecidos com os que ouvem vindos da aparelhagem instalada no fundo da sala. Uma e outra música que se desconstrói e se constrói novamente, até que o resultado final é uma pequena reconstrução de uma obra que eles conhecem, tocada por alguém que admiram imenso e desejam ser. Esta evolução permite-lhes sonhar, pensar que um dia podem tocar como esses ídolos, esses “seres” que parecem tão distantes mas agora mais perto.

Agora já existe alguma organização, já todos conhecem bem o seu papel e o que têm que fazer, as músicas nascem e crescem, o processo de composição evoluiu para um ponto onde já conseguem criar música, em vez de a imitarem...com alguma facilidade, as músicas ganham identidade, consistência e uma vida própria.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Imaginário III

Naquela manhã os seus olhos fixaram-se em todos os outros olhos procurando expressões, esgares que traduzissem qualquer sentimento que já tivesse vivido ou presenciado.

Passou a mesma entrada principal que, num ritual indesejado de tempo perdido na longa fila de espera, cruzava há coisa de 4 anos. As caras, apesar de diferentes, espelham todas os mesmos sentimentos. Conversas mais sorridentes, olhos mais lacrimejantes, mas as vivências, mais tarde ou mais cedo, comuns a todos - só uma questão de tempo.

Naquele dia estava sol. Reparava agora que a maioria das vezes que lá tinha ido até aquela altura tinha chovido. Ultimamente estava sol e perguntava-se se seria bom augúrio.

Passada a entrada principal o mesmo encontro com o segurança, as perguntas de sempre: "onde vai?" "sabe o caminho?" e a resposta a todas já sem pensar porque parecia já uma rotina, mesmo que se passasse mais de 6 meses sem lá ir.

No início do que se tornaria um hábito, uma componente da vida, virava à esquerda passando o segurança. Quando passou a virar à direita para se dirigir ao segundo andar o seu entusiasmo melhorou.

Agora, na sala de espera onde se habituou a esperar calmamente pela sua vez, silenciosa, iluminada, aprazível até, olhava para as caras que já não sabe se conhece ou não com uma vontade de dizer "bom dia, como vai?" mas que não faz por receio nem sabe bem de quê mas prefere não fazer.

Tanto a sua própria experiência pessoal como o conhecimento do ritual do lugar faz com que olhe para as caras e saiba o que estão a pensar. E se umas tem vontade de abraçar, oferecer o ombro e todo o tempo do mundo e dizer que vai correr tudo bem, com outras tem vontade de felicitar e "despedir" (porque nunca se sabe em que esquina vamos encontrar quem...) e outras ainda tem vontade de explicar tudo tim-tim por tim-tim e dizer que o mais importante é mesmo saber esperar, como se tudo isto fosse um desígnio maior para pôr à prova a capacidade de espera e de controlo da pessoa.

Chega a sua vez. Cruza olhares com duas ou três expressões que também conhecem a sua. Respirar fundo, sorrir e seguir.

Sem dar conta muito tempo passou até que pudesse sorrir. E até que pudesse ter aquele sorriso naquele sítio.


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